Desta forma, a Polícia Civil gaúcha presta informações em razão de uma decisão do ministro de 7 de novembro que mandava fazer as devidas identificações. O documento não identifica, no entanto, líderes e financiadores dos atos. Esse será o próximo passo da investigação.
A apuração foi feita pelo Gabinete de Inteligência e Assuntos Estratégicos da Divisão de Inteligência Policial e Análise Criminal da Polícia Civil. O documento ressalta que os “dados relacionados são informações de inteligência e por ora não foram confirmados atos de incitação ao crime”. Isto é, a lista não associa os nomes à prática de crimes. Em 31 páginas, são juntadas informações sobre as pessoas identificadas, veículos utilizados e postagens em redes sociais.
Sobre as ações desenvolvidas na região do Comando Militar do Sul, a Polícia Civil informa que “foi possível localizar faixas afixadas no passeio público com mensagens referentes às eleições e às Forças Armadas brasileiras. Todavia, não foi possível visualizar pessoas como responsáveis por tais objetos, tampouco há identificação quanto sua produção”.
Procurado pela reportagem, o Ministério Público do Rio Grande do Sul (MPRS) informou que “segue atuando e acompanhando o trabalho no Gabinete de Crise e das forças de segurança para promover a normalização da circulação nas vias da capital e demais cidades onde ainda ocorrem manifestações.”
Quem são os identificados
Entre os nomes, a Polícia Civil identificou o suposto envolvimento de pelo menos cinco agentes públicos nas manifestações:
- Tenente-Coronel Zucco: deputado estadual que se elegeu para a Câmara Federal nesta eleição;
- Heliomar Athaydes Franco: delegado da polícia civil gaúcha. Conhecido como Delegado Heliomar, concorreu a deputado federal, mas não se elegeu;
- Mariana Doernte Lescano: agente penitenciária que concorreu a deputada estadual, mas não se elegeu. Aparece nas redes sociais como Policial Mariana Lescano;
- Patrício Jardim Antunes: agente de segurança pública, conhecido como Inspetor Patrício. É vereador no município de Dom Pedrito e foi candidato a deputado estadual;
- Thiago Teixeira Raldi: conhecido como Comissário de Polícia Raldi.
Além deles, há outros cinco nomes vinculados aos atos:
- Vilmar Luiz Vicinieski: policial aposentado, morador de Guaporé, que aparece em redes sociais estimulando protestos;
- Jonathan Pires de Arruda: documento mostra que ele aparece em redes sociais incentivando os protestos;
- Ezequiel Vargas: documento aponta que ele é coordenador de um perfil numa rede social que estimula as manifestações;
- Edison Flores: aparece em várias publicações em redes sociais estimulando os atos, conforme o relatório;
- Viviane Freitas de Almeida: aparece em várias publicações em redes sociais estimulando os protestos.
A polícia também informou a suposta participação de duas pessoas, identificadas apenas pelo primeiro nome – Gilmar e Rafael – e o perfil deles nas redes sociais.
No restante da lista remetida ao STF, constam ainda os nomes de pessoas com registro de ocorrências policiais, entre elas, um adolescente infrator.
O que dizem os citados
GZH conseguiu contato de três dos citados e tenta com os demais.
Heliomar Franco
“Fui candidato a deputado federal e me manifestei com as minhas convicções políticas. Eu não fiz nenhum tipo de incitação, nem pedido de intervenção militar, por exemplo. Eu estava inclusive de férias numa dessas manifestações. Isso tudo dentro do que prevê a legislação brasileira de livre manifestação e sem violência. E sem qualquer tipo de bloqueio de vias“.
Tenente-Coronel Zucco
“Recebo com surpresa pela imprensa a informação da notificação da Polícia Civil do Rio Grande do Sul ao STF envolvendo uma postagem feita em minhas redes sociais. Já determinei à minha equipe de comunicação a análise de tal conteúdo para saber exatamente qual seu teor e do que se trata. Minha assessoria jurídica também já está analisando a questão, mas desde já reitero o que já foi externado na nota publicada pelas Forças Armadas no dia 11 de novembro:
‘A Constituição Federal estabelece os deveres e os direitos a serem observados por todos os brasileiros e que devem ser assegurados pelas Instituições, especialmente no que tange à livre manifestação do pensamento; à liberdade de reunião, pacificamente; e à liberdade de locomoção no território nacional.
Nesse aspecto, ao regulamentar disposições do texto constitucional, por meio da Lei nº 14.197, de 1º de setembro de 2021, o Parlamento Brasileiro foi bastante claro ao estabelecer que: ‘Não constitui crime […] a manifestação crítica aos poderes constitucionais nem a atividade jornalística ou a reivindicação de direitos e garantias constitucionais, por meio de passeatas, de reuniões, de greves, de aglomerações ou de qualquer outra forma de manifestação política com propósitos sociais’.
Assim, são condenáveis tanto eventuais restrições a direitos, por parte de agentes públicos, quanto eventuais excessos cometidos em manifestações que possam restringir os direitos individuais e coletivos ou colocar em risco a segurança pública; bem como quaisquer ações, de indivíduos ou de entidades, públicas ou privadas, que alimentem a desarmonia na sociedade.’
Dessa forma, me coloco à disposição para quaisquer outros esclarecimentos e reitero meu respeito às instituições e à Constituição Federal.“
Mariana Lescano
“Primeiro, recebo com muita surpresa o relatório da Polícia Civil que foi encaminhado ao STF. Sou policial penal e analista política que busca fazer um trabalho de informação e conscientização política para sociedade. Fui candidata a deputada estadual onde recebi mais de 22 mil votos de pessoas que confiaram na minha luta pela liberdade. Participo das manifestações, exercendo meu direito constitucional assegurado também pela lei 14.197 e reafirmado pela nota do Ministério da Defesa de 11 de novembro de 2022, deixando claro que todo a cidadão brasileiro pode participar de manifestação pacífica e ordeira. Sinto mais uma vez que o objetivo é a censura e o silêncio daqueles que questionam as instituições de Estado. E lembro que o processo democrático tem como símbolo maior o povo nas ruas. Diante disso, me sinto muito tranquila em saber que estou agindo dentro da legalidade no meu direito de cidadão brasileira garantido pela Constituição brasileira e pelos tratados internacionais que o Brasil é signatário”.
Fonte: GZH