Se há 12 anos o Brasil oficializou o 20 de novembro como Dia da Consciência Negra, foi porque em 1971 um grupo de jovens estudantes negros do Rio Grande do Sul decidiu se reunir para debater a questão racial no país.
Naquele momento, menos de um século depois da abolição da escravidão, a ideia do Grupo Palmares era “lançar uma semente” para tentar fazer crescer o debate sobre representatividade na sociedade. Hoje, um dos fundadores do grupo, Antônio Carlos Côrtes, vê a discussão consolidada, mas a chaga do racismo ainda viva:
— O racismo no Brasil não é velado, ele segue sendo ostensivo, como sempre foi. A evolução prática é pouca. A morte por ações policiais atinge mais negros, a fila de procura de emprego é formada por maioria negra, os garis são negros, os últimos lugares ocupados nos ônibus são ao lado de pessoas negras. Isso é muito dolorido — diz.
Advogado, radialista e escritor, Côrtes fundou o Grupo Palmares em 1971 ao lado de nomes como o poeta Oliveira Silveira, falecido em 2009, Ilmo Silva, Vilmar Nunes, José Antônio dos Santos e Luiz Paulo Assis Santos. A ideia do 20 de novembro como data de memória à luta negra veio quando Côrtes leu um livro sobre Zumbi dos Palmares e não conseguiu encontrar a data de nascimento do líder quilombola, apenas o dia de sua morte (justamente o 20 de novembro).
— Quisemos lançar uma semente para reescrever a história do Brasil. Não é uma luta contra os brancos, mas a favor dos negros. É uma luta para diminuir o fosso da desigualdade social, que começou com nossos ancestrais que chegaram ao Brasil a bordo de campos de concentração flutuantes e encharcaram o solo com suor e sangue. Hoje é uma data de reflexão. Como remanescente do grupo, vejo isso como êxito — afirma.
Se hoje Côrtes de forma positiva o crescimento de políticas de inclusão e ações afirmativas instituídas no Brasil, ainda vê muito a avançar na representatividade.
— O mais importante hoje é ajudar a promover a autoestima do povo negro com visibilidade em todos os sentidos. A comunidade negra precisa se enxergar em todos os escalões do governo, no judiciário, no alto escalão do exército, na magistratura, nos veículos de comunicação. É muito pouco a presença da negritude nesses espaços. São espaços que nos foram sonegados — afirma.
O grupo Palmares
Na Porto Alegre dos anos 1970, um grupo de jovens discutia a criação de um dia destinado aos negros no Brasil. Eles não queriam o 13 de maio, data em que a Lei Áurea pôs fim à escravidão, mas sem prever políticas públicas que garantissem educação e trabalho aos recém-libertados.
O racismo no Brasil não é velado, ele segue sendo ostensivo, como sempre foi. A evolução prática é pouca. A morte por ações policiais atinge mais negros, a fila de procura de emprego é formada por maioria negra, os garis são negros, os últimos lugares ocupados nos ônibus são ao lado de pessoas negras. Isso é muito dolorido.
ANTÔNIO CARLOS CÔRTES
Um dos fundadores do Grupo Palmares
O grupo queria um dia para a sociedade refletir sobre a situação a que os africanos foram submetidos ao serem retirados de sua terra para servirem aos brancos nas Américas – e as consequências na vida de seus descendentes. Inspiraram-se na morte de Zumbi dos Palmares, líder quilombola e símbolo de resistência, e o 20 de novembro passou a ser nacionalmente conhecido como o Dia da Consciência Negra.
Perfil
Antônio Carlos Côrtes foi eleito em 2022 como novo ocupante da Cadeira 11 da Academia Rio-Grandense de Letras.
Ele foi funcionário do Banco do Estado do Rio Grande do Sul (Banrisul) por 26 anos. Advogado militante, com atuação nas áreas de direito civil e criminalista, foi também secretário-geral da Junta Comercial do Rio Grande do Sul (Jucergs), bem como foi assessor superior da Comissão de Educação da Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul.
Côrtes foi apresentador, repórter, produtor e comentarista em diversos veículos de rádio e TV, tais como: TV Guaíba, Rádio Princesa, Rádio Farroupilha, RBS TV, TV Educativa (TVE), Rádio e TV Bandeirantes, Rádio Metrô FM e Rádio Gaúcha.
Antônio Carlos Côrtes foi membro fundador do Grupo de Pesquisas Palmares, em 1971, que implementou a data de 20 de novembro na comunidade negra, realçando a importância de Zumbi, iniciativa adotada nacionalmente. Em duas oportunidades, integrou e presidiu o Conselho Estadual de Culltura. É autor dos livros “Bailarina do Sinal Fechado”, “Rua da Praia 40⁰” e “Degraus da Vida”.
Fonte: GZH