A Controladoria-Geral da União (CGU) concluiu uma auditoria que identificou R$ 2,57 bilhões em fraudes no programa Farmácia Popular entre os anos de 2015 e 2020, abrangendo o fim do mandato de Dilma Rousseff (PT), a gestão de Michel Temer (MDB) e o início do governo de Jair Bolsonaro (PL).
O valor se refere a medicamentos que foram pagos pelo Ministério da Saúde e supostamente teriam sido entregues à população pelas farmácias. No entanto, os estabelecimentos não apresentaram notas fiscais que comprovassem a aquisição. A auditoria parte da tese de que “o estabelecimento não pode vender o que não comprou”, ou seja, se a farmácia não comprova ter adquirido os remédios, é possível que ela tenha registrado “vendas fictícias” que demandam do recurso público sem oferecer o retorno na distribuição de medicamentos.
Em nota enviada ao Estadão, o Ministério da Saúde disse que prioriza corrigir as distorções apontadas pela CGU e que a pasta também trabalha em conjunto com o Tribunal de Contas da União (TCU) para dialogar sobre os problemas encontrados e aperfeiçoar os sistemas de controle.
Foram mais de 362 milhões de registros de venda cujo estoque não tinha documentação fiscal. Isso representa 17,4% do total de operações do período. “A situação caracteriza desperdício de recursos públicos que poderiam ser aplicados em outras políticas públicas pois poderia ocorrer dispensação de medicamentos em valores inferiores aos informados ou, em pior hipótese, no caso de venda fictícia, prejuízo em relação a todo o valor repassado”, afirma o relatório da CGU.
O documento, entregue em novembro de 2023, concluiu ainda que o total de R$ 7,4 milhões em vendas de medicamentos foi lançado no sistema em data posterior à morte do beneficiário, que em teoria fez a compra ou retirou gratuitamente o remédio na farmácia.
“A situação denota desperdício de recursos públicos e possível fraude cometida pelo particular que efetua a compra, burlando os controles na farmácia, ou pelo próprio estabelecimento”, constata a CGU no relatório.
A auditoria cruzou dados prestados pelos estabelecimentos credenciados no programa com as aquisições desses mesmos medicamentos, informadas pela Receita Federal (base de Nf-e).
O programa
O programa Farmácia Popular foi criado em 2004 pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e relançado por ele, em seu terceiro mandato, em junho de 2023. A ação complementa a assistência farmacêutica do Sistema Único de Saúde (SUS).
Inicialmente, foram ofertados medicamentos com preços mais baixos. Em 2006, na primeira expansão do programa, o Ministério da Saúde fechou parceria com as farmácias e drogarias da rede privada, instituindo a modalidade “Aqui Tem Farmácia Popular”.
Desde então, houve um crescimento expressivo no número de estabelecimentos credenciados, passando de 2.955 pontos de venda em 2006, para mais de 27 mil farmácias particulares em 2020.
O dinheiro investido no programa no período foi de R$ 34,7 milhões em 2006, quando foi criado, para algo em torno de R$ 2,7 bilhões em 2021, segundo o relatório. A CGU fez a auditoria motivada pelo grande número de estabelecimentos cadastrados no programa e pelo fato de que parte do procedimento de controle é feita de forma manual.
Na conclusão do relatório, a CGU pede que o governo elabore um plano para confirmar o montante a ser ressarcido pelos estabelecimentos, bem como a aplicação de penalidades e que adote mecanismos de controle para que novas fraudes não ocorram.
Veja nota do Ministério da Saúde na íntegra
“O Governo Federal retomou o Farmácia Popular que estava desestruturado, com irregularidades e sem recursos necessários para garantir a assistência de mais de 22 milhões de brasileiros. Para isso, o Ministério da Saúde priorizou corrigir as distorções que haviam sido apontadas pela Controladoria-Geral da União (CGU). A pasta também trabalha em conjunto com o Tribunal de Contas da União (TCU) para dialogar sobre os problemas encontrados e aperfeiçoar os sistemas de controle.
Como resultado desse trabalho, somente em 2023, a aplicação de multas aumentou 771% e o número de estabelecimentos descredenciados ampliou em 707% em relação a 2022. Em 2023, 180 novos municípios passaram a ter acesso ao programa com novas unidades credenciadas.
Ressalta-se também que, atualmente, não são autorizadas as dispensações para CPFs de pessoas que tenham registro de óbito junto às bases da Receita Federal e do Cartão Nacional de Saúde (CNS). Sobre o relatório da CGU, é importante considerar que no período analisado, de 2015 a 2020, a falta da informação sobre código de barras, que não era exigido pela Receita Federal na nota fiscal dos medicamentos, prejudica a análise final.”
Fonte: GZH