O Tribunal Regional Eleitoral (TRE-PR), em Curitiba, dará início ao julgamento das duas Ações de Investigação Judicial Eleitoral (AIJEs) que solicitam a cassação do mandato do senador Sergio Moro (União Brasil-PR), nesta segunda-feira (1º), às 14h. O processo será conduzido presencialmente.
O TRE-PR também reservou a quarta-feira (3) e o dia 8 de abril para o desenrolar dos processos. A determinação da data final do julgamento dependerá da agilidade dos votos proferidos pela corte. Assim, o julgamento pode se estender pelos três dias previstos ou ser concluído antes do esperado, conforme o andamento das deliberações.
Como será o julgamento
O TRE-PR é composto por sete membros. Para que Moro seja cassado, é necessário que a maioria o julgue culpado. O presidente da Corte só vota em caso de empate — ou seja, caso o placar seja de três votos favoráveis e três contrários à cassação.
Os integrantes do colegiado ampliaram a cautela para o julgamento do senador por causa do impacto político e jurídico que a decisão deles terá. O relator do processo, Luciano Falavinha, não compartilhará antecipadamente o seu parecer com nenhum dos colegas. É comum em processos judiciais que os juízes disponibilizem o relatório com certa antecedência para que os demais integrantes da Corte conheçam em profundidade as provas e os argumentos do relator para embasar os seus votos.
Também foi definido que os juízes vão ler a íntegra dos seus votos para que a decisão final conte com os argumentos de todos os membros da Corte. Os demais integrantes do colegiado combinaram de não compartilhar os votos antecipadamente. Eles só conhecerão as posições uns dos outros na hora da votação. O objetivo é dar mais transparência ao julgamento.
Os membros da Corte Eleitoral vão analisar conjuntamente as duas ações que acusam Moro de ter causado desequilíbrio nas eleições para senador em 2022, quando foi eleito com 1,9 milhões de votos.
A partir da decisão tomada pela Corte paranaense, o caso deverá seguir para o TSE, que dará a palavra final sobre a situação do ex-juiz.
Por mais que o TRE do Paraná decida de forma desfavorável a Moro, ele não perderá de imediato o mandato no Senado e os efeitos da decisão ficarão suspensos até a análise pelo Tribunal Superior Eleitoral de eventual recurso apresentado por ele. A cassação será efetivada apenas se os magistrados em Brasília concordarem com a definição do colegiado regional.
Se isso ocorrer, o TSE vai convocar novas eleições para senador no Estado, para que uma nova chapa seja eleita para substituir o ex-juiz até o início de 2031.
Por que Moro é julgado?
Os magistrados vão julgar a cassação do mandato de Moro e a possibilidade de ele ficar inelegível por oito anos, caso seja considerado culpado pelos ilícitos eleitorais de abuso de poder econômico e caixa dois na pré-campanha de 2022.
Na ação, o PL afirma que o senador utilizou “estrutura e exposição de pré-campanha presidencial para, num segundo momento, migrar para uma disputa de menor visibilidade, menor circunscrição e teto de gastos vinte vezes menor, carregando consigo todas as vantagens e benefícios acumulados indevidamente, ferindo a igualdade de condições entre os concorrentes ao cargo de senador”.
A Federação Brasil da Esperança elenca uma série de privilégios que Moro supostamente teria tido durante a campanha eleitoral como media training (treinamento de imprensa), segurança privada, exposição midiática de presidenciável, veículo blindado, compra de telefone celular, hospedagens e viagens nacionais e internacionais.
A defesa do senador considera que a arrecadação de recursos e as despesas na pré-campanha não precisam ser submetidas às prestações de contas eleitorais. No início de dezembro, em depoimento ao TRE-PR, Moro disse que as alegações dos partidos devem ser “descartadas”. Segundo ele, elas não comprovam abuso de poder econômico na campanha.
No fim do ano passado, o Ministério Público Eleitoral (MPE) emitiu um parecer defendendo que o senador perca o mandato e fique inelegível até 2030. No documento com 79 páginas, os procuradores eleitorais Marcelo Godoy e Eloísa Helena Machado argumentam que os gastos na pré-campanha de Moro excederam o limite razoável. O TRE-PR é composto por sete magistrados. Caso quatro votem pela condenação, a chapa de Moro será cassada pelo tribunal regional.
Se isso ocorrer, o senador não perderá o mandato de imediato. Independentemente da decisão tomada no Paraná, o caso deverá seguir para o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que dará a palavra final sobre a punição imposta ao ex-juiz. Se a decisão do TSE for desfavorável a Moro, serão convocadas eleições suplementares para eleger um novo senador para representar o Paraná até 2030.
Voto de juiz escolhido por Lula pode ser decisivo
De acordo com o especialista em Direito Eleitoral Alberto Rollo, um dos principais pontos a se observar no julgamento é o desempenho do juiz José Rodrigo Sade que, nas vésperas da apreciação do caso de Moro, foi indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para compor o TRE-PR. A entrada de Sade na Corte se deu por conta da aposentadoria do juiz Thiago Paiva dos Santos, no final do ano passado.
Em 2017, quando era o juiz da 13º Vara de Curitiba, Moro condenou Lula a nove anos e seis meses de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. As sentenças foram anuladas em 2021. De volta ao Palácio do Planalto, o petista explicitou em diversos momentos que ainda possui rusgas com o senador.
Em março do ano passado, quando a Polícia Federal (PF) descobriu um plano do Primeiro Comando da Capital (PCC) para atacar Moro, Lula disse que o caso seria uma “armação” do ex-juiz.
Para Rollo, há um receio de que o voto de Sade seja “encomendado”, ou seja, que o novo magistrado tenha sido escolhido pelo governo federal devido a sua concepção sobre o abuso de poder econômico na pré-campanha.
— O receio é que talvez, em algum momento, um dos critérios tenha sido perguntar: como é que você vê o abuso do poder econômico na pré-campanha eleitoral? — explicou Rollo. — E aí, com essa resposta, mais ou menos já se saiba como ele vai decidir o caso concreto do Moro— completou.
Julgamento pode motivar mudança nas regras eleitorais
Para a advogada eleitoral Ana Cláudia Santano, o julgamento de Moro pode se tornar uma oportunidade para o estabelecimento de critérios técnicos sobre as pré-campanhas.
No Código Eleitoral brasileiro, não há descrições sobre valores que os candidatos devem empregar e nem qual seria o início e o fim de uma pré-campanha.
O precedente que deve ser usado para julgar Moro é, ironicamente, a cassação da ex-senadora Selma Arruda (Podemos-MT), conhecida como “Moro de saias”, no final de 2019. Selma teve o seu mandato cassado por caixa dois e abuso de poder econômico durante as eleições de 2018, ou seja, os mesmos crimes que são imputados pelo PL a Moro.
Ana Cláudia defende que sejam criados critérios objetivos para orientar os candidatos antes do início das campanhas eleitorais e afirma que a análise atual utilizada pelo direito eleitoral é “falha”. “O conceito de pré-campanha não funciona aqui e não funciona nos países que ele existe. É uma tentativa muito louvável da gente de tentar regular o poder econômico das candidaturas e deixar elas um pouco mais equilibradas. Mas o fato é que a gente está falhando”, explicou.
Paulo Ferraz acredita que o julgamento deve motivar o Legislativo a fazer uma reforma eleitoral para regular o tema, tendo em vista que uma eventual condenação do ex-juiz da Lava Jato pode servir como um precedente que leve a outras cassações de parlamentares.
“Vai dar uma chacoalhada no Congresso para que ele tenha que legislar sobre pré-campanha, algo que nós advogados eleitoralistas brigamos há muito tempo”, observou o especialista.
Fonte: GZH