Os três réus pela morte de Gabriel Marques Cavalheiro foram absolvidos do crime de ocultação de cadaver durante julgamento militar, em Porto Alegre. Um dos policiais foi condenado a um ano de reclusão por falsidade ideológica. A sentença foi publicada na madrugada desta sexta-feira (21).
O Ministério Público vai recorrer da decisão.
Gabriel morreu no ano passado, em São Gabriel, após uma abordagem policial. O sargento Arleu Junior Jacobsen e soldados Raul Veras Pedroso e Cleber de Lima responderam na Justiça Militar pelos crimes de ocultação de cadáver e falsidade ideológica.
O único condenado por falsidade ideológica na sentença desta sexta-feira foi o soldado Cleber de Lima. A Justiça Militar considerou que ele inseriu dados falsos no boletim de ocorrência da abordagem do jovem. Todos os réus foram absolvidos das demais acusações na Justiça Militar.
Já na Justiça comum, os três réus ainda respondem por homicídio triplamente qualificado. O julgamento não foi marcado.
Na quarta, os três policiais foram interrogados no Tribunal de Justiça Militar (TJM). Os réus responderam ao processo detidos no Presídio Militar de Porto Alegre.
Os policiais teriam agredido Gabriel, que foi imobilizado e levado para dentro de uma viatura militar. Testemunhas disseram que ele foi atingido por “pelo menos dois ou três golpes de cassetete”. O corpo foi localizado no dia 19 de agosto, submerso em um açude na localidade. No mesmo dia, os três policiais foram presos preventivamente.
Os três brigadianos são julgados pelo Conselho Permanente da Justiça Militar, que tem cinco integrantes: uma juíza de direito, um oficial superior, neste caso um major e outros três oficiais (capitães).
Os interrogatórios duraram cerca de cinco horas. O sargento Arleu Júnior Cardoso Jacbsen admitiu excessos na abordagem de Gabriel, mas negou que tenha agredido e matado o jovem.
O soldado Cleber Renato Ramos de Lima reconheceu não ter detalhado a abordagem em boletim. Ele não registrou onde Gabriel foi deixado, após a abordagem. E o soldado Raul Veras Pedroso afirmou que Gabriel foi algemado porque oferecia risco à própria segurança e à dos policiais.
Gabriel era um jovem de 18 anos que se mudou de Guaíba, na Região Metropolitana de Porto Alegre, onde morava com os pais, para São Gabriel, na Fronteira Oeste do estado, para prestar o serviço militar obrigatório e ficar perto da bisavó, uma mulher de 97 anos.
Ele desapareceu no dia 12 de agosto, em São Gabriel, após ser abordado por três policiais militares na Avenida 7 de Setembro. Uma vizinha da casa em que ele estava hospedado, que pertence a um tio, chamou a polícia porque, segundo ela, o jovem estaria forçando o portão que dá para o pátio em frente ao imóvel.
Os policiais militares que foram ao local teriam agredido Gabriel, que foi imobilizado e levado para dentro de uma viatura militar. Testemunhas disseram que ele foi atingido por “pelo menos dois ou três golpes de cassete”. Foi a última vez que Gabriel teria sido visto com vida.
Com a ajuda do Corpo de Bombeiros, os familiares que residem em São Gabriel começaram a procurá-lo. Inicialmente, a Brigada Militar (BM) negou que tivesse levado Gabriel de viatura até algum lugar.
Depois, corrigiu a informação e disse que os policiais levaram o jovem para uma região no interior do município conhecida como Lava Pés, distante cerca de 6 quilômetros de onde houve a abordagem. O sistema de GPS do veículo indicava que foi feito o trajeto até o local.
O corpo de Gabriel foi localizado na sexta-feira (19), uma semana depois do desaparecimento. Ele estava submerso em um açude na localidade.
Os três policiais responsáveis por abordar e levar Gabriel até Lava Pés foram presos preventivamente no início da noite de sexta, horas antes do corpo ser encontrado.
Em depoimentos em três ocasiões, negaram envolvimento no assassinato de Gabriel.
A causa da morte de Gabriel foi “hemorragia interna”. O documento, divulgado na última segunda-feira (29), aponta “sinais de ação por instrumento contundente”.
Reportagem da RBS TV revelou que o núcleo de inteligência do Ministério Público (MP-RS) recuperou em telefones mensagens trocadas pelos policiais suspeitos do crime. Nelas, agentes ironizam o caso e mostram preocupação com a investigação.
Em uma delas, um deles diz “tem que aparecer, de preferência, vivo”, se referindo ao desaparecimento de Gabriel. Os pais se disseram “estarrecidos” com o teor das mensagens.
O que diz a defesa dos policiais
A defesa do sargento Jaconsen, representada pelo advogado Maurício Adami Custódio, afirma que um policial civil que nutria desavenças públicas contra a Brigada Militar participou da investigação. Existe um áudio, que está no processo, em que este agente teria dito que se vingaria da BM. O advogado ainda sustenta que a jaqueta de Gabriel, que foi encontrada próxima do açude, foi plantada no local.
“Há provas de imagens de que a jaqueta estava seca na parte de cima e parecia ter sido estendida naquele tapete verde da vegetação. O drone da polícia sobrevoou a região na terça-feira e não foi encontrada. Na quarta, a jaqueta aparece como se tivesse sido posta naquela região”, diz.
Já a defesa dos soldados Lima e Pedroso, representada por Vania Barreto e Shaianne Lourenço, limitou-se a dizer que eles estão sendo julgados por crimes que não cometeram.
“Continuamos afirmando, com convicção, que durante a abordagem não houve agressão alguma ao Gabriel. Que apenas lhe conduziram até a localidade de Lava Pés, a pedido do próprio Gabriel que, perguntado aonde queria ficar, pediu que lhe deixassem em Lava Pés. Quando Gabriel desembarcou da viatura estava vivo e bem”, afirma a defesa.
Para o Ministério Público, a suposta relação de vingança pessoal não está provada no processo. A promotora de Justiça Lisiane Veríssimo da Fonseca é enfática. “O conjunto de provas que temos nos autoriza a conclusão da responsabilidade dos três pela morte do Gabriel”.
Rejane Lopes, advogada da família de Gabriel, afirma que as mensagens trocadas entre os policiais respondem o ocorrido com Gabriel: “Confiamos na Justiça”.
Fonte: G1RS