Na última sexta-feira (20), policiais civis do Rio Grande do Sul realizaram operações em cinco cidades para prender estagiários e servidores públicos da Justiça. Eles são acusados de vazarem informações sigilosas de processos – mandados de prisão ou de busca e apreensão – contra traficantes de drogas ligados a uma facção criminosa.
“Eles recebiam informações consecutivas sobre quando seriam cumpridos os mandados, quem seriam os alvos. Em quais casas a polícia entraria”, conta a delegada da Polícia Civil do Rio Grande do Sul, Fernanda Amorim.
A depender do investigado, maior o preço cobrado pelos estagiários.
“Os valores variam e variam de acordo com essa importância, com o grau hierárquico que eles ocupam na organização”, destaca a delegada.
Vazamentos de operações contra traficantes
Segundo a polícia, a facção criminosa envolvida nas investigações é responsável pelo tráfico de drogas em um condomínio em Porto Alegre. De acordo com o delegado, imagens mostram como as informações vazadas permitiram que eles conseguissem retirar material ilícito de origem criminosa no local.
Cinco dias depois, quando a polícia preparava outra investida contra a quadrilha, um bandido avisou ao outro, por mensagem: “a mulher do foro diz que tem uma mega operação sigilosa”. A mulher seria uma estagiária do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que forneceu informações para a quadrilha.
Em Santa Maria, interior do Rio Grande do Sul, policiais da delegacia de homicídios não conseguiram prender um gerente do tráfico de drogas porque as casas estavam vazias. As investigações da Promotoria mostram que o mandado de busca contra o traficante foi vazado com a senha de uma servidora do fórum de São Gabriel, cidade que fica a 162 quilômetros de Santa Maria. Quem teria acessado a ordem de prisão foi a advogada de um dos suspeitos.
“Chegando ao local nos deparamos com casas vazias é como se já estivessem nos esperando”, diz o policial.
O Fantástico mostrou ainda que, inclusive, ex-estagiários do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul estão entre os acusados.
“Nós temos cerca de 4400 estagiários, cerca de 8500 servidores e cerca de 1000 magistrados. Houve algo lá próximo a 500 senhas que foram identificadas como já de ser estagiários que já não estavam mais, mas foi rapidamente resolvido isto”, diz o desembargador Vinicius.
Outras investigações
Uma outra investigação apura o vazamento de um pedido de busca na casa de uma mulher que mora com o companheiro, que é suspeito de receptação. Pessoas mandaram mensagens para ela tentando vender informações da investigação.
“Eles entraram em contato falando que eles iam bater na minha casa e que se tratava de uma investigação que era do meu marido”, relata a esposa extorquida.
O conteúdo dizia: “tem interesse em saber o conteúdo da nova busca que terás?” e “2 mil, te envio o doc” (veja na imagem abaixo).
“E eu falei que eu não tinha interesse e eles debocharam ainda ‘tu vai lembrar de mim”.
A delegada responsável pelo caso também investiga um outro vazamento que beneficiou uma quadrilha responsável por desviar mais de R$ 1,2 milhões de uma única conta bancária. Os bandidos tiveram acesso a todos os detalhes antes de o juiz decidir se decretaria as medidas. A operação contra os acusados de estelionato foi suspensa por causa do vazamento.
O desembargador confirma que os estagiários conseguem acessar essas informações porque usam senhas de outros profissionais com mais acesso. O que é irregular.
“Há um número muito grande de demandas e um quadro de pessoal, muitas vezes insatisfatório para atender a essa demanda”, diz Vinicius.
14 estagiários foram afastados
O Tribunal de Justiça, que participa das investigações, já afastou 14 estagiários e investiga a utilização indevida das senhas de outros 7 servidores. Eles podem responder por violação de sigilo funcional e associação criminosa, com pena total de até sete anos.
“Todas as senhas foram trocadas, desde os magistrados a estagiários. orientando os servidores a não repassarem senhas, magistrados, não repassarem senha. Ninguém. Senha é uma informação pessoal do indivíduo, então não pode repassar”, afirma o desembargador Vincius.
Fonte: GZH