Futuro político, a disposição de participar da disputa nacional, as articulações para manter a base aliada unida no Estado, enquanto encaminha a sucessão do seu governo, a polêmica dos pedágios e da CPI na Assembleia, os índices de qualidade do ensino e a valorização dos servidores. Em entrevista exclusiva ao Correio do Povo, no Palácio Piratini, o governador Eduardo Leite (PSD) faz balanço e também reflete sobre o cenário político do RS.
O senhor falou que o seu nome está posto para 2026 no país e no RS. Qual o seu diferencial em relação aos outros pré-candidatos à Presidência?
É muito sobre chamado, oportunidade e onde melhor posso contribuir. O cenário nacional ainda não está bem definido e estamos acompanhando as movimentações. Mas no que tem se apresentado agora, diria que vai se criando um espaço para que a gente possa buscar apresentar algo alternativo a essa polarização entre Lula e um candidato do bolsonarismo. Acho que o Brasil fica discutindo passado.
Nesse sentido, reforça o meu partido, o PSD e o presidente Gilberto Kassab, a possibilidade de ter uma candidatura à presidência. Acho que entre os nomes que estão aí postos, o que melhor eu posso oferecer é justamente a independência. Eu não apoiei nem o Lula, nem o Bolsonaro nas últimas eleições. Sinto-me em condições de poder falar sobre um projeto alternativo, mas eu tenho plena consciência de que isso não depende apenas de mim, depende do partido, da circunstância política. Insisto, sequer estou buscando ser um candidato.
Eu estou disponível para, no entendimento que houver, apresentar e liderar essa agenda alternativa para o país. Acho que nos primeiros meses do ano que vem nós vamos ter melhor entendimento sobre esse quadro e onde é que melhor eu posso dar a minha contribuição.
“Acho que nos primeiros meses do ano que vem nós vamos ter melhor entendimento sobre esse quadro (presidencial)” | Foto: Mauro Schaefer
Ser vice é uma possibilidade?
Eu diria que é menos provável, porque qualquer candidatura que faça, exige uma renúncia em abril. Para liderar um projeto, faz sentido uma renúncia em abril. Agora, nem acho que haverá em abril definição de chapas inteiras. A definição de um vice sempre vem nas convenções, que é em julho. Então, se renunciar em abril para pensar na possibilidade de julho. Eu não teria problema de ser um candidato a vice, não é isso. A questão é que, se não for para liderar o projeto, então é melhor eu tocar a nossa agenda do Rio Grande.
Acho que entre os nomes que estão aí postos, o que melhor eu posso oferecer é justamente a independência. Eu não apoiei nem o Lula, nem o Bolsonaro nas últimas eleições.
Como o senhor enxerga hoje a disputa ao Senado, em que seu nome é cotado?
Seria um caminho natural. As principais pesquisas me dão uma liderança e uma posição relativamente confortável para uma candidatura ao Senado. É possível que, eventualmente, as condições políticas exijam que eu possa contribuir ao RS sendo um candidato ao Senado e possivelmente um senador.
Mas, pode ser, esse é o que nós ponderamos, que a melhor contribuição que eu possa dar, que aí é a minha prioridade, é o processo sucessório. Então, antes de pensar em ser alguma coisa, quero garantir que aquilo que a gente fez nesses últimos sete anos e vamos para o oitavo ano, não se perca. Estou em um projeto no RS como governador e vou com ele até o fim. E ele envolve trabalhar para que essa agenda tenha continuidade.
Então, vou priorizar estar onde eu melhor possa contribuir para o meu processo sucessório aqui, que tem o nome do (vice-governador) Gabriel (Souza), com uma preferência. E eu digo preferência porque ele mesmo, na conversa que tem com os nossos aliados, como os Progressistas, admite a possibilidade de composições em que outro candidato, outro partido, esteja na cabeça de chapa.
Mas vou priorizar estar onde melhor possa contribuir. E, eventualmente, é estando no governo até o final, cuidando das coisas do governo, garantindo as entregas e ajudando na eleição de uma outra forma que não como candidato.
É possível manter a base unida em torno do nome do Gabriel?
Eu confio que sim e que a gente tem essa oportunidade. É legítimo aos partidos que queiram protagonizar, eu cito muito aqui o Progressistas, porque é um partido bem estruturado, com um grande número de prefeituras, com uma bancada relevante na Assembleia, no Congresso.
Tem toda a legitimidade de querer protagonizar. Agora, se for compor com alguém, melhor compor conosco. Afinal, ao longo desses sete anos tiveram o líder do governo, o chefe da Casa Civil durante um bom período, secretarias relevantes. O deputado Covatti Filho, que é um pré-candidato, foi meu secretário. O deputado Ernani (Polo), que é um outro pré-candidato, é nosso secretário.
Então, a gente tem uma afinidade. Não faz sentido que se associe, na minha visão, a um projeto que representa o contrário do nosso, que ataca, que diverge do nosso. Temos que trabalhar para estar juntos. Mas, sei que a política envolve uma série de componentes.
E quanto ao Republicanos?
Nós respeitamos cada uma (das bancadas). Buscamos aproximar aqueles que têm uma identidade conosco. Nitidamente, nesse segundo mandato, talvez pelo enfrentamento do processo eleitoral passado durante o segundo turno, tenha se criado algumas dificuldades a mais. A esquerda sempre foi oposição.
E, naturalmente, a gente observa que esse enfrentamento com o candidato da direita acabou gerando algumas feridas. Mas entendo que a nossa convergência é muito maior que a divergência. E, do ponto de vista do interesse político eleitoral, alguns podem entender que devam fazer alguns enfrentamentos para a eleição parlamentar. Para a eleição de um deputado essas pautas interessam. Agora, para uma eleição de governo, tem pautas muito maiores e mais abrangentes que a gente trabalha conjuntamente. E o Republicanos, majoritariamente, é um grande parceiro, e eu quero vê-lo conosco.
“Eu confio que sim (manter a base unida) e que a gente tem essa oportunidade” | Foto: Mauro Schaefer
O senhor tem o receio que a CPI esvazie o leilão do bloco 2?
Entendo que a CPI não colabora com o melhor interesse do Estado. Querer ajudar a aprimorar os modelos é legítimo e desejável, mas encontra outros caminhos para isso. O próprio governo faz audiências públicas, consulta pública, a Assembleia poderia formar uma comissão especial de acompanhamento.
O instrumento da CPI parece ter a intenção de alguns, não vou dizer de todos, de criar desgaste político eleitoral para o governo. E, eventualmente, pode criar maiores dificuldades para o Estado, não para mim, para o governo, porque a questão da concessão rodoviária é quase que pacificada no país. Tarcísio faz em São Paulo. Lula faz nacionalmente. Então, não é uma questão ideológica. E o ataque aqui parece residir muito mais por questão eleitoral.
Há crítica também sobre o uso dos valores do Funrigs.
(O Funrigs) é uma grande oportunidade de ter recursos para aportar e fazer obras, além do que a tarifa é capaz de viabilizar. A receita de uma concessão rodoviária vem da tarifa que é cobrada. Agora, se você vai pedir um volume de investimentos que não é suportado pela tarifa, você vai ter que aportar. O governo do Piauí, do PT, tem uma modalidade de concessão que aporta recursos porque assegura uma receita para o concessionário.
No nosso caso, o Funrigs é uma fonte importante de recursos para poder viabilizar nessas estradas, investimentos que vão dar mais resiliência ao Estado. A gente está falando de estradas que foram importantes como rotas alternativas, de contenção, de alteamento de pontes. Tudo que vai tornar as estradas mais resistentes para futuros eventos climáticos.
Seriam as obras de resiliência a diferença com o bloco 3 que não teve aporte público e tem valor das tarifas parecido?
O valor da tarifa quilométrica no bloco 3 está acima dos blocos 2 e 1 porque foi feito antes da existência do Funrigs e com volume de obras estabelecido. Se você observar concessões no Sudeste, depois que a estrada já está em um determinado patamar, porque foi feita uma concessão lá atrás e vai ser feita uma nova concessão para manutenção, o valor tarifário fica em um determinado patamar. Se é uma estrada que liga o Centro-Oeste ao Sudeste em que trafegam determinados tipos de veículos em um volume maior para acessar os portos, a tarifa também é impactada.
Por isso que essas comparações têm que ser feitas respeitando essas diversas variáveis. Os blocos 3, 2 e 1 têm as suas características. São realidades muito distintas.
O bloco 1 está em fase de análise. Quando fará o devolutivo?
Toda a estruturação dos nossos projetos tem o apoio do BNDES, que acompanha e ajuda a fazer a modelagem. O que nos dá muita garantia de que o processo está sendo feito com transparência, com lisura, com órgãos públicos respeitáveis. Aliás, a CPI sugere irregularidades, então terá que chamar o BNDES para fazer esclarecimentos.
O bloco 1 teve as consultas públicas, a audiência pública e nós estamos processando e ponderando tudo que veio. Vieram mais de 180 contribuições e com o apoio do BNDES estamos desenhando cenários. Se queremos uma tarifa menor, então vai ter que ter menos obra aqui, menos investimento ali. Então tem vários cenários que estão sendo analisados para identificar aquele que melhor atenderá essas demandas, sabendo que nunca vai ser unanimidade.
O senhor vai assinar a adesão do Propag?
Nós estamos manifestando o nosso interesse de adesão ao Propag, tivemos a aprovação na Assembleia e acho que é uma evolução importante, embora não resolva todos os problemas relacionados à dívida.
E o governo aceita os termos do Propag? Está em discussão renegociar a questão dos valores que estão suspensos?
O Propag é substancialmente melhor do que o RRF para a gestão do Estado, mas digo que ele não é a solução total porque ainda me deixa indignado essa realidade em que a União trata de forma desleal o Rio Grande do Sul em relação a outras unidades. A União endereça para várias outras regiões incentivos, benefícios, fundos constitucionais, companhias de desenvolvimento e que não existem para o RS e o Sul.
No caso do Rio Grande do Sul, ainda tira 12% da nossa receita. O equivalente do que a gente investe na saúde é o que o Estado manda para Brasília na forma do pagamento da dívida. Nos insurgimos contra isso, mas de resolução política é muito difícil, porque precisa passar no Congresso, ter vontade do presidente da República e os presidentes não demonstram vontade de resolver isso. Mas acho que o RS precisa continuar lutando para buscar melhores condições futuramente.
“Ainda me deixa indignado essa realidade em que a União trata de forma desleal o Rio Grande do Sul” | Foto: Mauro Schaefer
Temos que reconhecer que boa parte dos investimentos que o governo tem anunciado recentemente são via recursos do Funrigs, que é exatamente o dinheiro da dívida.
E aí a gente vê a diferença que isso faz para nós. Mas só pra lembrar que a gente só tem esse dinheiro disponível porque a gente fez as reformas que fez no início do nosso governo.
E teve uma enchente.
O que quero dizer é o seguinte: no início do meu governo, o Estado não pagava a dívida, por força de uma liminar que o governo (José Ivo) Sartori tinha conseguido. E faltava dinheiro para pagar salário, pagar hospital, pagar qualquer coisa. O Estado estava atrasando dinheiro para tudo. E estava com as alíquotas (de ICMS) majoradas. Hoje temos a alíquota de 17%, as de combustível, energia e comunicação caíram.
E nós estamos com as contas em dia e estávamos preparados para pagar a dívida, como estávamos pagando, inclusive. Em 2022, 2023 e 2024 a gente já estava pagando e com as contas em ordem. Ou seja, a gente só tem esse dinheiro do Funrigs, no acordo que foi possível com a União, porque o Estado construiu espaço fiscal no seu orçamento.
O que aconteceu foi que veio a enchente e conseguimos com a União o acordo. Mas vamos supor que lá em 2019, quando eu assumi o governo, tivesse acontecido a enchente e a União oferecesse um acordo de não pagar a dívida para poder fazer investimentos, seria um acordo inócuo.
E o ano que vem (com eleição) é o melhor ano para abrir essa discussão em Brasília?
Não, mas acho que tem que começar. Um ano eleitoral naturalmente enseja alguns desafios, em vista do tom político e eleitoral. Mas essa conversa tem que começar tecnicamente, por dentro, porque mesmo que os governos possam mudar, existe toda uma estrutura técnico-burocrática que assiste ministros e que precisa começar a entender essa situação. A enchente deixou a olhos vistos a necessidade que nós precisávamos do recurso, mas do ponto de vista econômico, o Rio Grande do Sul perdeu ao longo dos últimos anos mais com as estiagens do que com a enchente. Ao longo dos últimos seis anos a gente teve quatro estiagens severas que nos fizeram perder de 30% a 40% da nossa safra e que afetaram muito a nossa economia.
E reverter essa situação da estiagem é bem mais complexa?
Sim, mas existem alternativas que são, por exemplo, reservação de água. A gente precisa dar suporte para os nossos produtores para que eles possam promover investimentos que reduzam o impacto das estiagens. Então, tem que fazer barramento, tem que fazer a irrigação com investimentos em pivôs, vários formatos de irrigação para proteger as nossas safras e garantir ganhos de produtividade.
O Estado precisa entrar nisso e nós entendemos que é pertinente conversar com a União no sentido de que ‘olha, vocês enxergaram a nossa dor pelas enchentes, enxerguem também a da estiagem e me ajudem a promover investimentos aqui em irrigação, sem isso não vamos conseguir sustentar níveis de produtividade que me permitam gerar riqueza, ganhar impostos e conseguir te pagar a dívida que estás me cobrando’.
“Com a situação (da educação), não (estou satisfeito). Mas com a evolução, estou orgulhoso” | Foto: Mauro Schaefer
Quando eleito, o senhor prometeu que a Educação seria a sua bandeira. O senhor está satisfeito com a situação da educação no Estado neste exato momento?
Com a situação, não. Mas, com a evolução, estou profundamente orgulhoso e convicto que vai trazer muitos resultados. Havia 19 escolas com tempo integral, são mais de 300 hoje e vamos chegar a mais de 500 no ano que vem. É uma evolução concreta. As crianças não tinham uniforme escolar, passaram a ter. Agora vão receber, inclusive, um cartão para o tênis.
Tudo isso para poder criar um clima melhor dentro das escolas. A gente aumentou o recurso destinado à merenda escolar. Eram R$ 14 milhões, foi para R$ 170 milhões. A gente conseguiu evoluir muito na execução de obras nas escolas também, porque a gente mudou o formato de contratação, além de disponibilizar recursos. E finalmente está deslanchando aí um grande programa de reforma e reestruturação das escolas. E ainda vamos pagar um 14º salário. Então, a gente se preparou para isso.
O Estado tem essa capacidade financeira, tem essa capacidade fiscal. São evoluções importantes. Temos um mecanismo de gerenciamento na educação (que a gente implantou neste ano) semelhante ao da segurança pública, em que a gente monitora e faz reuniões mensalmente com os coordenadores de educação. Analisamos quatro indicadores – que são desde a execução do Agiliza (que é o dinheiro que vai na escola) à frequência, aulas dadas aos alunos, as notas, a evolução deles por região – para acompanhar e cobrar evolução. Então, tenho certeza que isso vai trazer resultados.
Alguma previsão de um novo reajuste geral dos servidores para 2026?
Você tem professores e o piso do Magistério. A correção que sai do piso, a gente aplica integralmente na tabela, atendendo aos professores. A maior categoria. Depois você tem segurança pública. A gente contratou um reajuste parcelado de 12,4% que está sendo implementado. Depois, você tem as diversas outras carreiras administrativas e outras funções em que o Estado foi fazendo ajustes nas carreiras.
Então, tem um grupo menor de servidores sobre os quais a gente ainda não conseguiu evoluir e estamos analisando esses grupos de servidores para ver o que a gente pode fazer. Revisão geral é pouco provável diante das restrições financeiras, embora a gente continue sempre analisando e vendo as condições. Mas, a gente vem priorizando olhar “carreiras a carreiras” e temos promovido ajustes.
Qual o legado que o senhor espera deixar no final do ano que vem ou em abril do ano que vem (caso o senhor venha a renunciar)?
É difícil de escolher um, porque nós avançamos em todas as áreas. A gente avançou muito. Na segurança pública, eu acho que tem um grande legado. O Estado passou a funcionar bem, é referência em segurança pública hoje no Brasil. Eu não tenho dúvida que a gente também vai deixar um grande legado na retomada da capacidade de investimentos, nas parcerias com o setor privado e na educação.
Fonte: Correio do povo
















